segunda-feira, 29 de novembro de 2010

A janela




Pulou o muro. Não resistia. Não resistiu. Não conseguia passar por ali todo dia e não olhar pra dentro.
A noite sonhava com o muro. A tinta descascada e a janela. Logo ali. Assim, tão perto. Tão pronta para ser espiada.
As cortinas sempre fechadas. Mesmo à noite. Mesmo no calor do verão. Não conseguia olhar pra dentro.
Uma vez só passara na frente da janela e a vira. Os cabelos soltos. A pele solta. Nada envolvendo a pele. Nada....
Não conseguia mais dormir. Pensava, sonhava com o muro e a janela e a cortina fechada e o vulto que vira e não sabia de onde vinha tanta angústia, tanta inquietação.
Suava frio. Não sabia o que era: “Ai, que aflição. Ai, que vontade de ver novamente. Nem que por um segundinho só. Ai, que eu me mordo, ai, que eu me mato, ai, que eu me morro de tanto pensar.”
Não aguentou. Pulou o muro.
Transpassar aquela barreira de tijolos foi transpassar o limite que encarcerava toda a liberdade. Os passos do muro à janela, cautelosos e temerosos, foram o alívio desafogador da alma: ali estava o que pelo qual tanto transpirara. Ali, sentada na cadeira. Olhos fechados. Pernas levemente abertas deixando o ar refrescar por entre as coxas. E ficou ali a olhar. Como é bom realizar o que se quer.



foto: Gui Zawa

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